Prova Cega Tawny 20 anos II: uma montanha russa de surpresas

De queixo caído. Admirados. Surpreendidos. Agradecidos. Se calhar é melhor mesmo dizer abençoados. (Obrigado, meu Deus). É possível ser surpreendido depois de termos estado presentes, há um mês numa prova cega com algumas das principais referências do Vinho do Porto? Oh se é. (Felizmente não conhecemos tudo e uma certa ignorância tem essa virtude – o ah, o wow, a admiração e o imprevisível). Um brinde à novidade e espontaneidade.

Esta resposta mostra-nos que o mundo do vinho do Porto pode ser mesmo uma viagem por referências históricas e perfis já definidos (é como ir a Paris e visitar a Torre Eiffel e comprar o postal – o que está muito bem), como também uma jornada pela inovação, pelo sangue novo, pelas novas gerações e pela procura de um futuro, diga-se e, desculpem a redundância, muito futuro. (O vinho do Porto não tem que ser uma coisa antiga, rústica, pois não?)

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Um assombro, espantosa (pela admiração, qualidade e surpresa) é a primeira que nos ocorre dizer, após a segunda edição da Prova Cega de Vinho do Porto Tawny 20 anos, que contou com 12 referências (garantimos que nos aguentámos herculeamente, a são e salvo de qualquer vírus e sem grandes desperdícios) diferentes da prova realizada em fevereiro, também na Charming House Cedofeita, e uma vez mais organizada pelo Paulo Pimenta, da winenstuff.com.

Fomos arrebatados pelo Kranemann 20 anos, referência que para nós era praticamente desconhecida (caramba: alguns dias depois ainda apetece), e também pela complexidade, serenidade e equilíbrio do Vieira de Sousa (que belo fim de tarde daria). A confirmação foi também o Blackett (perfeito para qualquer ocasião, mas um queijinho ia tão bem), marca que já conhecíamos e que confirmou o fantástico caminho traçado pelos responsáveis deste projeto.

Mas qual será para nós a escolha acertada? 

Não podemos dizer que esta prova foi melhor que a anterior, até porque o melhor elogio que podemos fazer é que manteve o nível, apesar de ter tido claramente um foco diferente.

  • Paulo Pimenta, em conversa, admitiu a dificuldade de preparar esta prova. Percebemos. Podemos dizer que esta foi uma prova de contrastes (e não foi a preto e branco).

Os vinhos foram servidos aos pares e a cada par um contraste, diferentes perfis. (Foi uma espécie de montanha russa vínica com 6 voltas, mas sem enjoos) Entre a doçura e a acidez, entre a rusticidade e a elegância, entre um âmbar mais escuro ou uma cor mais vívida e brilhante, entre um perfil mais suave e outro perfil mais impactante, provavelmente entre o envelhecimento em Gaia ou o envelhecimento no Douro. (ou entre o final da noite à lareira, ou o por do sol em tarde de verão).

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A prova foi riquíssima, pedagógica e, sempre de muito difícil pontuação, já que naturalmente um Tawny 20 anos é o que é, e face à qualidade inegável, as variações são nuances, apesar de ser possível detetar diferentes perfis. (…pontuar ao 12º vinho…é preciso dizer mais?)

Os vinhos que mais nos surpreenderam e arrebataram, ao contrário da prova anterior, foram precisamente os 3 primeiros classificados pelos presentes (jogar no Euromilhões? ou é apenas bom gosto nosso?). O Kranemann é de facto um vinho fabuloso (uma pequena investigação por alguns sites levou a perceber que este vinho tem apenas 89 pontos pela Robert Parker. Comentário Tudo Incluído: Só? Será que a a marca influencia? Hmmm…Fica o pensamento). Este é um vinho que revela um equilíbrio difícil de conseguir, comparado com outros vinhos que preferem estar nas extremidades. E é aquele que seguramente não nos cansamos de beber. (era capaz de dizer que o meu cérebro e o meu palato ainda estão nesse jogo divertido de provar a complexidade que não cansa). O Blackett 20 anos para nós é também um vinho fantástico, com imensa frescura, equilíbrio, notas de café,  baunilha, frutos e caramelo. Não é um vinho de notas tostadas e muito torradas, tem um final longo e aprazível. (reforço vai um queijo, uma sobremesa não muito doce?)

Por fim, o Vieira de Sousa revela notas de chocolate, café e, surpreendentemente, pêssego (ou casca de pêssego se quiserem…chegar deu trabalho). O toque frutado com aromas mais quentes, e torrados (talvez resultado do envelhecimento em toneis) confere-lhe um aroma especial. Apesar disso, é um vinho delicado com final longo.  Quinta da Pacheca e Quinta de Cottas e Churchills foram também vinhos que ficaram na nossa retina. (basta olhar para os pontos para perceber que só havia vinhos bons..abençoados os participantes).

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Pontuação média dos participantes na prova.

Importa-nos agora olhar para o preço. Reforçamos aqui que os preços apresentados, resultam de investigação online e apresentamos o preço mais baixo que encontrámos.

Nesta prova,  o Quinta da Pacheca Tawny e o Churchills são vendidos numa garrafa de 0,5l, enquanto todos os outros usam garradas de 0,75.  Inicialmente, consideramos o Quinta da Pacheca como aquele que tem um menor investimento inicial e que pode ser um fator decisivo para a compra.

Porém, já após a publicação do artigo, fomos contactados pela Kranemann, informando que o vinho poderá ser encontrado, a um valor competitivo, dependendo do distribuidor. De acordo com a informação assumimos um valor indicativo de 40 euros (claro que poderá variar).

Outro fator que importa sublinhar, uma vez mais, é a dificuldade de encontrar o preço dos vinhos. (estamos em 2020, só que não parece). Poucos são os produtores com loja própria, facto que complica toda a jornada do cliente, infelizmente. (na verdade o que apetece dizer é que enerva). Há muito por fazer a este nível. Há preços discrepantes e revendedores que, claramente, abusam no preço (provavelmente para vender a estrangeiros menos informados). 

Quanto ao Kranemann, pensávamos que era  aquele que apresentava um preço mais alto (a qualidade paga-se, mas...afinal não. O vinho apresentará um preço final competitivo) Apesar de ser uma marca com menor notoriedade e ser também aquele que é mais difícil de encontrar à venda (e quando dizemos difícil, estamos a ser simpáticos), o facto de aceitarem pequenas encomendas pode facilitar a vida aos interessados, até ao vinho ser disponibilizado em maior escala (ao que parece está para breve).

(*Após a informação que nos foi concedida pela marca, tivemos que alterar por completo a tabela e a nossa avaliação final).

Tal como na prova anterior, as opções com preços mais baixos estão mais para o fim da lista. Não há regra sem excepções: o Kranemann, e o Vieira de Sousa assumem-se como uma opções quase imbatíveis na relação preço/qualidade. O custo por não deixa grandes dúvidas. 

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Considerando o preço como fator decisivo (e as nossas preferências) também incluiríamos o Andresen como opção muito equilibrada. Para quem quer um consumo mais reservado e prefere investir menos e ter um processo de compra mais facilitado, mesmo tendo menos quantidade, então o Quinta da Pacheca será uma ótima opção, capaz de ser bebido sozinho, como a acompanhar uma boa sobremesa mais rústica. (simpático packaging e opção inteligente da marca…vai é desaparecer rápido).

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Após esta análise, para os amigos que querem um mergulho mais a fundo e querem saber mais fica uma descrição mais longa e séria sobre a prova. (senão podem passar para o fim, pois vamos deixar uma pequena promessa).

A prova:

Começámos com o Bulas 20 anos, no nariz surgiram notas, de café, avelã, pinhão e verniz. Na boca tem toque de mel, café, especiarias. Pareceu-nos que era uma das referências mais doce, precisava de algo mais fresco para contrastar. No final da prova voltamos a este vinho e confirmou-se. Fica difícil beber um copo e querer repetir. Tem complexidade, mas é de inegável doçura. Aqui o contraste foi com o Dalva, de cor mais escura, no nariz café, noz e um toque torrado. Pareceu-nos ser um perfil mais rústico, onde se nota mais a presença da aguardente. A acidez está bem presente e tem um toque mais torrado.

De seguida partimos para o Quinta de Cottas e adorámos a intensidade da côr, o caramelo no nariz e um toque torrado a lembrar um bom toffee. Na boca sublinhamos o final longo, e os aromas mais abertos e exuberantes. No Croft 20 anos, encontrámos novamente um perfil mais rústico e nariz perfumado e algo especiado. Na boca notámos novamente mais a aguardente, café e caixa de tabaco.

O Churchills 20 anos no nariz é menos intenso, mas percebemos a presença do fruto seco. Na boca mostra acidez, é fresco, pinhão e intensidade. Foi neste momento que para nós chegou a primeira surpresa. O vinho 6, Kranemann 20 anos, traz-nos um leve e agradável aroma a avelã, subtil mas suficiente para nos querer fazer provar. Na boca tem complexidade, untuosidade, equilíbrio, leveza, acidez, frescura, com as notas de frutos secas, bem conjugadas com frescura, notas de madeira. Ao contrário do Bulas 20 anos, que tivemos dificuldade em ir para além de um primeiro copo, este vinho faz-nos querer mais, desejar um pouco mais e deixar-nos levar pelas fantásticas sensações.

O Quinta da Pacheca 20 anos levou-nos novamente para um perfil mais rústico, de cor mais escura e acidez bem presente. Na boca é mais torrado, mais seco. Com o Blackett , voltámos a uma maior subtiliza. No nariz sentimos frescura, um pouco de verniz, caramelo, café. Na boca a complexidade leva-nos para o café, caramelo, especiarias.

No RP 20  (Ramos Pinto) encontrámos um vinho de cor âmbar mais escuro, no nariz sente-se bem o álcool, a madeira. Na boca salientam-se notas de chocolate preto, tosta, cacau, creme queimado. Este é um vinho em que também se nota alguma presença da aguardente. O Niepoort 20 anos, levam-nos para um perfil elegante. No nariz faz-nos lembrar chocolate de leite. Na boca tem acidez e aromas a passas, café. É um vinho claramente mais fresco que o anterior.

Na última dupla tivemos o Vieira de Sousa 20 anosAndresen Royal Choice 20 anos. O Vieira de Sousa leva-nos para aromas de chocolate e café. Na boca traz-nos frutos secos, em especial avelã, pêssego, café, com toque torrado e um final longo. A acidez, frescura e lado frutado está bem integrada com o seu lado mais tostado. Por fim, no Andresen, o que mais apreciámos foi a sua incrível longevidade, após a prova. No nariz evidencia notas de noz e chocolate. Na boca sobressaem notas de passas.

Ufa, chegámos ao fim da nossa descrição. Sabemos que foi longa, mas acreditámos que faz-nos ver quão difícil, complexa e aprazível pode ser uma prova de vinho do Porto Tawny 20 anos. Se a informação para uma boa compra é relevante, nós esperamos estar a ajudar no processo.

Notas finais: em pouco mais de um mês provámos 24 vinhos do Porto de Tawny 20 anos (sim, sim 24!!) e ficou claro que há marcas que procuram manter o seu perfil, enquanto outras estão claramente a inovar, a revelar-se. Há ainda outras que ainda procuram estabilizar o seu perfil. É claro o sangue novo nesta área. A nossa promessa final será agora juntar essa experiência adquirida e eleger os favoritos do Tudo Incluído, sempre considerando que para lá das provas e dos momentos, o preço e o prazer que retiramos são fatores decisivos. Partilhem e comentem, nós gostamos e agradecemos. 

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